Natal de 2024: Um Espelho Embaçado
Era Natal. As luzes piscavam frenéticas, quase como um pedido de socorro. Entre enfeites reluzentes e vitrines abarrotadas, havia um contraste gritante: o vazio humano. A crise econômica, política e social do ano parecia ter se infiltrado em cada canto, apagando o brilho das celebrações e transformando o que deveria ser um tempo de esperança em um teatro de sobrevivência.
As ruas estavam mais perigosas do que nunca. A violência, não satisfeita em ser apenas física, se manifestava em olhares desconfiados, em palavras cortantes e em silêncios ensurdecedores. A solidariedade virou mercadoria rara, enquanto a empatia parecia um conceito arcaico, perdido em algum livro de histórias.
Nas redes sociais, travavam-se batalhas de moralidade e fé. Muitos apontavam o dedo para os defeitos das religiões alheias, sem sequer olhar para os próprios atos. "Cristão só de nome", diziam uns. "Religioso hipócrita", acusavam outros. Mas a verdade, tão simples quanto dolorosa, era que poucos praticavam o amor que pregavam. Amar ao próximo virou uma frase vazia, repetida como mantra, mas esquecida na prática.
E havia aqueles que, apesar de respirarem, estavam mortos. Mortos pelo cansaço de uma rotina sufocante, pela falta de propósito ou pelo medo paralisante de dizer "não". Diziam "sim" para agradar, para não confrontar, para manter uma falsa paz, enquanto, por dentro, sufocavam seus próprios sonhos e vontades. Perdiam oportunidades de mudar suas vidas, de traçar novos caminhos, de dizer a verdade.
No Natal de 2024, a desumanização não era uma novidade. Mas talvez fosse mais evidente. As famílias reunidas estavam mais conectadas aos seus celulares do que umas às outras. A ceia era farta para alguns, mas havia um gosto amargo de superficialidade. Ninguém perguntava como o outro estava de verdade. Ninguém queria ouvir uma resposta longa.
Ainda assim, em meio a tanto caos, o Natal trazia uma oportunidade rara: a de olhar no espelho. Não aquele espelho embaçado pelas aparências, mas o espelho interno, onde enxergamos quem realmente somos.
A crise não era só do mundo lá fora, mas da humanidade dentro de cada um. A violência que tanto repudiávamos começava no jeito como tratávamos quem discordava de nós. E a desumanização era resultado da nossa própria falta de coragem em amar, perdoar e reconhecer nossas falhas.
Talvez, o maior presente daquele Natal fosse uma pausa para refletir. Sobre o que éramos, sobre o que poderíamos ser, sobre o que ainda dava tempo de mudar. Porque, no fim das contas, o Natal nunca foi sobre luzes, presentes ou tradições. Sempre foi sobre a esperança de renascer.
Mas o renascimento exige coragem. E, em 2024, talvez fosse isso que faltasse: coragem para dizer "não", para dizer "sim" ao que importa, para viver de verdade e, finalmente, para sermos humanos novamente.
Zezo Freittas
|
|
Tags:
Comentários
Artigos relacionados
Agressividade, Descredibilidade e Pressões: As Eleições Municipais de 2024 em Teresina
Campanha eleitoral 2024 chega a reta final
leia maisComo escolher um candidato a vereador ou prefeito sem se arrepender
Avaliar o caráter, a história e a conduta do candidato é essencial para evitar decepções e garantir uma gestão ética.
leia mais